sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Lembrança para Clara



Lago do Titicaca, 1 de junho de 2008

Já não me lembrava como é bom estar sã. A sensação de eternidade, de eterna permanência na dor que não cessa quando se está enfermo é das piores que o ser humano pode experimentar.
Finalmente bem!
No Titicaca, dentro da balsa, atravesso suas águas ditas sagradas, adorando a história que acabo de ouvir. A história é de que lá nasceram o Sol e a Lua, pra quem quiser acreditar. Para os campesinos daqui é verdade absoluta.
Essa balsa me traz lembranças de idas e vindas para Niterói, o mesmo embalo que a Baía de Guanabara propõe aos que por lá navegam.
Estou feliz de rever os niños bolivianos! Vou sentir falta deles.
Estou acordada, olhos atentos. No andar de cima só o céu. Clara tem medo de barco como eu tenho de avião. Ela dormiu. E agora não está mais com medo. Que bom remédio o sono.

Isla del Sol, 2 de junho de 2008

Que bom chegar até aqui. Este foi sem dúvida um dos lugares mais lindos por onde passei ao longo dos meus 27 anos. Vinte e sete anos não são nada. As ruínas que encontrei aqui têm mais de 9.000 anos. E estão lá, lindas e enigmáticas. Se eu chegasse aos 9.000 anos queria que fosse assim. Hoje visitei a pedra onde foram gerados o Sol e a Lua. Estou começando a acreditar nessa história só porque ela é tão bonita e misteriosa quanto esse lugar que esconde segredos embaixo de cada pedrinha e bem no fundo desse lago imenso.
Que belas histórias tenho ouvido... Juan as conta com tanto orgulho. Ele deve ter seus 50 anos e nunca morou em outro lugar. Nasceu ali, como o sol e a lua, mas a diferença é que ele jamais foi embora.
Subi na rocha e me sentei. De lá podia ver algumas ovelhas com seus filhotes. Tirei o sapato e pisei com a sola dos pés. Juan disse que a rocha era sagrada e eu sentiria se tocasse as mãos. Acho que era. Com os pés na pedra me senti rocha, céu, ovelha, água, Keruak, tudo ao mesmo tempo e indivisível. Estava estranhamente feliz.
É realmente sagrado esse lugar, todo feito de uma matéria que não se pode desvendar qual é.
Essa brisa hippie bate com toda força, é muito engraçado.
Clara adoeceu e não está vendo nada isso. Eu fico boa, ela adoece...

Lago do Titicaca, 3 de junho de 2008

Quero voltar um dia. Indo para Copacabana na mesma balsa em que vim para a ilha, vejo uma mulher que tenta interagir com duas cholas que estão no barco. Ela fala e pergunta coisas ao mesmo tempo em que fotografa tudo de uma maneira tão histérica que me faz trocar olhares e risos discretos com uma das cholas. Nós observamos a mulher e achamos graça, somos cúmplices.
Clara dorme novamente. Penso na minha chegada em Buenos Aires.

2 comentários:

  1. Que boas lembranças vêm a tona com suas palavras! Mesmo doente, aproveitei muito essa janela do nosso quarto. Talvez uma das mais belas vistas que tive do meu quarto. Apesar de acamada, me senti muito bem naquela ilha. Dormi o sono dos justos.
    Precisamos descobrir mais lugares juntas, és uma maravilhosa companheira de viagem.
    Beijos, Clara.

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  2. Que lindo Gabi! Fiquei louca pra conhecer tbm o lugar onde nasceram o sol e a lua e ouvir as tantas histórias. Conta aí!
    Essa noite sonhei que tava viajando e não conseguia voltar pra casa... sonho bom.
    Beijos

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